sexta-feira, 16 de dezembro de 2011




“É fácil imaginar você perto quando a sua ausência ensurdece até o pensamento mais alto. ― E tarde da noite era até fácil me lembrar disso mesmo quando tentara tapar todos os buracos da falta que você fazia dentro do quarto gelado e da fumaça que neblinava todo o ambiente, deixando o cheiro do tabaco emanar no ar. ― O tic e tac do relógio, a parede enebriada e som dos ventos. Tudo. Era oco e vazio demais. E meu coração ainda sim disparava mesmo sem motivo coerente para a situação. A minha embriagues talvez explicasse metade da ironia que causava meu sorriso entristecido entre as margens de lembranças que escorriam de volta a minha cabeça.
Jogados pelo quarto a garrafa de vodka e whisky atrapalhavam a passagem e interrompia o cheiro de lavanda misturado no cigarro que floreava o quarto. E eu imaginava você ali. ― Deitada na cama e com a cabeça apoiada no travesseiro, tentando não derramar lágrimas de saudade, eu imagina sua presença no meio de toda a ausência. Parado frente a toda bagunça, entre as roupas atiradas pelo chão e seu tom de voz doce e suave dizendo o quão errada eu estava naquele momento por me lamentar tanto… E depois o seu silêncio. (Sempre tão frequente e casual.) ― Soava até engraçado a maneira como ele sempre me vinha claramente a memória melhor do que qualquer outra lembrança.
A sua silhueta desenhada, sua precaução. O seu pairar eminente sobre todas as palavras antes de pronunciá-las. ― Você sempre fora tão cuidadoso ―, e se descuidou de mim. Ainda tento entender o porque. O porque fora tão complicado, o porque da saudade corroer tanto. ― Entre os lençóis ainda busco você, o seu cheiro. Mas entre o esbranquiçado das paredes eu me corava por ainda pedir você aqui, mesmo sabendo que já não voltarias mais, ― e nem litros de vodka ou lágrimas derramadas mudariam isso. Talvez eu tenha sido muito por nós dois, não é mesmo? Tento convencer-me sempre que esse sempre foi o “ás” de todas as minhas questões. Que você notara que eu sempre seria melhor, e…
As lágrimas caíam do meu rosto como enxurrada nos dias chuvosos, ― cobriam-me por lembranças suas que caíam junto a toda aquela amarga sensação de desespero que vinha da boca do estômago. ― Eu sabia que nunca havia sido o melhor. E tentara me convencer disso estupidamente, sabendo que nunca me aceitaria por ter deixado tudo escapar… Escorrer pelos dedos e deixar você parti. (Porque eu sei que a culpa fora minha também.) E você. É… Você mesmo. Sempre tão duro e tão doce. Uma mistura crucial que me cegava completamente de amor, paixão. Aquele fogo que aumentava tarde da noite quando deitávamos sobre os lençóis e eu aconchegava-me entre seu corpo completamente nu, fazendo toda a insegurança desaparecer… E aí você desaparecera também. ― Não dói, não é? ― Como dói em mim.
De repente, entre o silencioso quarto e o barulho tedioso do relógio entre as paredes agoniantes do quarto me fazem notar que são duas da manhã e que já se passara tempo demais. ― Você deveria ter ligado e me dado notícias suas ―, minhas lágrimas não se contêm sem você aqui. Eu deveria explicar de qual forma clara para que você entendesse? Ou melhor, para que você voltasse? ― Não queria resposta se isso fosse derrubar-me no mar de caos que piorasse minha situação deitada naquela cama. Eu só queria respostas se pudesse secar todas as minhas lágrimas. Você entende, não é? ― As minhas mãos escorreram para o lençol, sentindo um úmido na lateral que me fez querer entender o que era. O interesse desaparecera. Eu não queria me mover mais. Eu queria sua voz, queria o som embriagado da sua saudade, a preocupação.
Ao lado da cama, uma escrivaninha mármore coberta por álcool e com alguns maços de cigarro tomava parte do meu celular que estendia metade para o ar, como se um toque pudesse fazê-lo cair no chão. ― Passei a mão por ela de modo que eu não precisasse levantar a cabeça para saber o quão tonta ainda estava. ― Sentir sua falta doía, mas não sentir você doía mais ainda… E cortava torturadamente por dentro, deixando-me sangrando. E o pior é que a morte não vinha. E eu não desejava ela. Muito pelo contrário, eu só queria vida, para poder lembrar que ainda sim existira um sorriso meu que passou pelos meus lábios por culpa sua. Tudo culpa sua. Tanto tal tristeza, como a maior felicidade.
E perfumando toda a neblina do ambiente, eu ainda podia sentir o cheiro do seu sorriso misturando-se a minha falta de confiança. Havia tanta falta, tanto medo, tanta distância. Da minha parte, e da sua, pois você ainda se lembrava, certo? ― Sei que sim. Os requisitos me faziam notar que você voltaria. ― Mesmo eu sabendo lá no fundo, com a pontada de vontade que me restara de respirar que a porta não se abriria, que o telefone não tocaria e que seu endereço não apareceria na minha janela por um instintivo milagre que me traria completamente toda a fé que eu perdi quando você partira. Algo havia de me ajudar, por mais rude. Nem mesmo que um anestésico, ― mas e a embriagues? Por que não me fizera esquecer você? ― Até os mais fortes venenos te subestimavam, notas?
Segurei o telefone firme nas mãos e antes que pudesse trazê-los para perto do ouvido, senti ele escorrendo pelos meus dedos e fazendo um baque alto e surdo no chão do quarto, sobre alguma roupa que certamente estaria jogada ao lado da cama. ― Eu não devia ligar… Você jamais ligaria, certo? Você não se importaria se eu sumisse por anos ou me embriagasse até o fim da vida para tentar entorpecer tamanha saudade. Você nunca sentiria tamanha dor que entrava pelas veias durante a manhã e corria pelos dias ali. E antes de dormir, caminhavam até o cérebro e programava você. (De forma que torturava sempre que eu te imaginava tão esculpido que quase dava para sentir sua presença.) ― Seu rosto estava desenhado na palma da minha mão. Por dentro, lá dentro… No sangre, na alma. Você, como a droga mais relevante e que acabara, que sumira do mapa foi embora de forma que machucava todas as tarde calorosas e impetuosas em meio as primaveras que você costumada me visitar. ― No outono será que você apareceria? ― A resposta estava tão clara como o seu rosto no meus pensamentos. Não… Será nunca mais então? Nos perdemos mesmo em meio a tanto orgulho e confusão de palavras e sentimentos? Acabou? Assim…? Claro como começou. E eu só não queria deixá-lo partir, pois você devia ter me dado um lugar e um espaço maior dentro de si. Me apertei demais onde não cabia.
A insônia estava começando a me incomodar quando decidi tentar levantar da cama tão cambaleante que talvez eu pudesse cair em meio ao vão empilhado de bagunças do quarto e nunca mais me levantasse. Eu, ― sem sombra de dúvidas ― adoraria permanecer intacta no frio do chão que ocuparia totalmente a agourenta camada de suor que estalava minha testa em meio ao silêncio inundante do quarto. ― Era tão desagradável pensar tanto no que eu evitara nos últimos doze meses… Quando você me deixara no saguão do aeroporto prometendo a mim ―, que  me pareceu convincente que fosse uma promessa para si também ― que voltaria e me colocaria nos braços como fizera da primeira vez em que nossos lábios se tocaram dentro do carro apertado tentando nos achegarmos no banco traseiro de modo que eu não quisesse nunca estar em outro lugar senão ali.
Meus pés alcançaram o chão e puxei o vidro de whisky quase vazio para entorná-lo na boca, tentando matar minha insônia com cada gota existente do álcool. O tabaco já havia acabado e o cheiro dele aliviava um pouco enquanto descia queimando todo o líquido completamente ressequido, fazendo minha narina franzir. Meu corpo caiu sobre a cama novamente pouco depois que me mão pegara o telefone que se estendia no chão quase invisível em meio a tantos panos. Disquei seu número de trás para frente 8 vezes antes de discá-lo corretamente. Desliguei logo em seguida. ― Eu não devia ligar. ― Ouvir sua voz me torturaria até o último instante agoniante que me levara a tal embriagues e as palavras não se contentariam em sair com calma e adequadamente. (E eu não controlaria todas as lágrimas.) Seria uma fraqueza grande demais.
Mas eu precisava tanto ser fraca assim durante essa noite nebulosa e quente que me atormentava todas as lembranças…
Seu número apareceu na tela do telefone mais uma vez e apertei “chamar” sem ter muita noção de como todo o efeito me entorpeceria consecutivamente. ― Eu sabia que isso me faria revirar as noites e que todo o álcool pararia sobre a descarga depois de tantas reviravoltas esquisitas no estômago e você provavelmente não me aguentaria queixar tanto da vida e da saudade que você fazia. E como fazia. Você machucava mesmo estando tão claro que estava longe o possível de mim para sequer levar todas as lembranças embora. ― Mas me prendi tanto a você, as coisas, ao cheiro. A saudade…
Desliguei o telefone.
No fundo eu sabia que uma ligação não faria você voltar… E já doera bastante por uma noite para eu ter que aguentar uma vida inteira.”

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